quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Enquanto o ônibus que espero não vem.

Uma longa rua interiorizava longe da principal. Estreita, duas mãos onde cabe uma. De repente alargava, como a cabeça de uma colher. No fim estavam igreja e mar.
A ruela servia para duas coisas: Pra chegar lá, e para sair de lá. Sem saída.
Um cachorro, no telhado de um albergue, latia para todos os turistas que chegavam, enquanto eu esperava o ônibus.
A porta de vidro da entrada do albergue refletia as luzes dos carros que se aproximavam, fazendo com que eu sempre soubesse quando havia alguém vindo. Se a luz fosse muito grande, era meu ônibus.
Em meio ao tédio, comecei a reparar nos carros. Engraçado; eles chegavam, davam meia volta e iam embora. Pelo menos a maioria deles. Continuei a notar, e a achar estranho.
Quando até aquilo caiu na mesmice, notei os passageiros dos carros:

Um fusquinha 69, dentro dele meu colega de cursinho de ingles. Dá "oi" ao chegar, e tchau ao ir.
Caminhonete vermelha, meu professor de educação física da oitava série.
"Oi" vindo, "tchau" indo. E assim seguia.

Já estava me divertindo, brincando de reconhecer os rostos que passavam, quando lembrei dos que estacionavam. Um em particular me chamou a atenção, estacionado de frente para o mar. "Muito bonito" - Eu penso - "Corcel 73, creme. Meu pai tinha um desses". Pra minha já não total surpresa, ele estava lá dentro, fumando os cigarros 'free azul'. O mesmo que fumou durante toda sua vida. Percebo estacionando, pessoas que há muito conheci, e ainda conheço muito bem. Todos aqueles amigos e amores e familiares que ficaram pra vida. A mão treme.Minhas moedas do passe caem no chão. Abaixo para alcança-lás. Sinto uma dor tremenda nas costas.Observo minhas mãos, estão mais pálidas do que nunca, veias aparentes. Olho no retrovisor de um dos carros: Cabelo branco, vista cansada, pele enrugada. Os ponteiros impiedosos do relógio deixaram cicatrizes fundas por todo meu corpo e alma.
Transtornado e confuso; ao mesmo tempo calmo, sereno e conformado. Volto a observar o reflexo no vidro da loja. É A luz, minha luz. Sim, grande e clara demais, é o ônibus. Adeus, tanto aos que estavam de passagem quanto aos que estacionaram, tenho que pegar meu ônibus e seguir viagem.

Um comentário: